Caixa de Pandora

domingo, 13 de setembro de 2009

A contribuição da Filosofia para a educação



O ser humano é construído historicamente, socialmente e culturalmente. O homem não nasce pronto, acabado. Sua constituição humana se dará na medida em que aprende, evolui, interage com outros seres. É a interação entre esse ser e a sociedade em que ele vive que vai formá-lo enquanto um ser humano. É pelo aprendizado que se dá a humanização do homem. Sem essa humanização, o homem é apenas um animal, um ser da natureza.



Uso como exemplo o caso das meninas-lobo da Índia. Elas viveram durante muito tempo isoladas da sociedade humana, longe do convívio com outros seres de sua espécie. Viveram como e com os animais (lobos) e adquiriram os hábitos, os costumes e formas de sobrevivência desse “grupo social”. Não se desenvolveram como seres “humanos” e sim como animais (lobos), tiveram uma “formação” animal e agiam como tal. Ao serem reintegradas à sociedade “humana”, tiveram imensas dificuldades de adaptação. Uma das meninas não sobreviveu e a outra levou muitos anos para desenvolver-se minimamente tanto do ponto de vista cognitivo como emotivo e social.



Esse entendimento de construção sócio-cultural da formação do ser humano traz implicações profundas para a ação docente. Nosso papel, enquanto professores, é o de dar subsídios para que esse ser humano aflore e se desenvolva plenamente, em condições de integração com os demais seres humanos. Educar para a vida em sociedade, para que o ser humano possa agir em sociedade e para o viver em grupo, em harmonia, com respeito às normas de civilidade e interação cultural e social. Viver em sociedade visando o bem comum, agir de forma tal que leve em conta que o bem que desejo para mim deve ser o mesmo bem que desejo para todos.



“A educação é esse espaço privilegiado de construção do humano”. (Carbonara, 2008). Penso que ao falarmos em educação estamos falando em ética. Não da ética como discurso vazio, retórico, mas como postura de vida, como princípio norteador de minha ação enquanto educador. O professor é construído e constituído pelas suas leituras, de mundo inclusive, mas também o é pela sua postura, sua ação. Na educação temos um espaço privilegiado de relação com o ser humano que é de troca e aprendizado. Somos muitos nas escolas, das mais variadas formações, e aprendemos muito com isso. Aprendemos e ensinamos, numa relação de mão dupla.


Penso que aprendemos-ensinamos muito mais com nossa postura, nosso exemplo, nossa conduta em relação com o outro do que imaginamos. É através do respeito às diferenças, da responsabilidade partilhada, do senso de justiça, do pensar no bem comum que ensinamos-aprendemos. Somos fruto daquilo que aprendemos-ensinamos. Ao pensar e nos colocarmos no lugar do outro, entendemos melhor a sua perspectiva, a sua visão do mundo. Colocando o outro como prioridade, como centro da nossa ação, como ponto de partida para podermos ajudar a construir uma sociedade melhor, mais justa, democrática e cidadã. Penso em como cada um de nós pode fazer isso? É difícil. Vivemos hoje em uma sociedade em que o que o vale mais é o indivíduo e não a construção do coletivo. A sociedade do “ter” e não a do “ser”. Difícil, mas não impossível. Somos educadores e pensamos no outro, no coletivo, no bem comum. Nosso papel é disseminar essa mudança de paradigma. É de privilegiar o coletivo, o bem comum a todos, não a uns poucos privilegiados. É a busca do que é justo e bom para todos.


Ao estudarmos as concepções filosóficas, tivemos uma construção conceitual para nossa ação docente que transcende a sala de aula e o mero domínio de técnicas de ensino. A técnica é importante sim, mas não basta. Penso que ao falarmos do ser humano, de ética e de conhecimento fizemos muito mais do que estudar para uma disciplina específica, com um cronograma a ser seguido e cobranças a serem feitas. Penso que abrimos a mente para novas formas de ver e entender o ser humano, seja ele nosso aluno ou não. Penso que aprendemos a questionar valores cristalizados da nossa sociedade e enfrentá-los de forma mais consciente, com uma base teórica mais sólida. Questionar esses paradigmas e confrontá-los com a nossa vida pessoal e funcional (professores) foi enriquecedor. Isso mudou-nos de forma irreversível.



Não somos mais as mesmas que éramos quando aqui chegamos e isso é muito bom. Pensamos de outra forma, olhamos de outra forma, compreendemos nosso alunos de uma forma mais cuidadosa. Temos mais cuidado com nosso pensar, com o nosso agir e com isso somos mais responsáveis pelo que estamos construindo. Trabalhamos basicamente com mentes, geralmente mentes jovens, em formação, é muita responsabilidade e muita alegria ao mesmo tempo. Auxiliamos as suas descobertas e isso é muito prazeroso. Porém, se nos fecharmos numa visão estreita e preconceituosa, podemos estar tolhendo esses seres de serem o que eles quiserem ser. Penso que a compreensão da constituição do ser humano, do respeito ao outro, do conhecimento fez-nos melhores seres humanos e não apenas melhores professores.

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