Caixa de Pandora

terça-feira, 3 de maio de 2011

A estranha fala da arte


Sônia Maris Rittmann

Anita Koneski através de seu texto propõe uma reflexão a partir de um outro ângulo, que “pense a arte-educação por caminhos diversos” em função da “crise” de interpretação, que vivemos na contemporaneidade. Trata-se de uma provocação: fazer com que o arte-educador pense de um modo diferente, levando em conta a vocação da arte contemporânea para o estranhamento. As questões levantadas pela autora são extremamente desafiadoras, e penso que não tenhamos as respostas:

“(...)Como fica a Arte-Educação mediante as propostas de Blanchot, Levinas e tantos outros teóricos que nos cercam hoje com suas teorias semelhantes, a respeito da arte contemporânea? Ou como falar para nossos alunos, ou ensinar arte a partir de uma arte que se posiciona com vocação para o estranhamento, conforme atestam Levinas e Blanchot? Ou, ainda, como ler um objeto de arte que sufoca enquanto é presença de algo que nos parece um absolutamente outro em nosso meio, quando sempre demos a ele a função de contribuir para nossa existência?”(KONESKI)

Essas perguntas se justificam a partir do entendimento de que a forma tradicional de ler arte tornou-se obsoleta e já não faz sentido diante da complexidade da arte contemporânea. Além disso, estamos diante de um aluno que também não é mais o mesmo e que está muito mais conectado com a arte contemporânea, a mídia, as Bienais, a arte nas ruas, do que com a da arte do passado.

Os fundamentos em que se baseavam o entendimento do que é ou não arte já não se aplicam. A própria noção de contemplação já não nos serve mais. Nas palavras da autora, “(...) há um momento em que parece não ser mais possível pensar a arte como antes, seja como pensamento moderno” ou do passado clássico”.

A autora ainda aborda a questão da arte contemporânea se de difícil compreensão:

“Como pensar uma arte em que tudo o que nos constrange é a sensação de que estamos diante de um objeto que não tem, aparentemente, absolutamente nada a ver com a nossa existência, pois não mais parece definir um mundo histórico? Como falar desse objeto aos nossos alunos, quando se trata de falar de contemplação da obra de arte? Será que a contemplação nos moldes tradicionais serve a essa arte? Então, o que é contemplar uma obra de arte hoje?”

Ficamos sem saber como pensar e como agir diante dessas questões, que são nossas também. Os conceitos e pressupostos que utilizávamos para compreender a arte até então já não servem mais. Como falar dessa arte para nossos alunos? Não é possível pensar o mundo e a arte como antes. Uma nova forma de ver a arte se institui: o estranhamento. A arte já não é mais o espaço de contemplação, mas um espaço de questionamento. Estamos em um espaço de sombras, de dúvidas, de obscuridade... Fica cada vez mais difícil de ver, de entender... A arte não revela, esconde. Não reponde, pergunta. Estamos na arte contemporânea no espaço do (in)visível, do que está oculto, da negação, do ruído... só nos resta procurar as pistas, as nuances, as possibilidades...Trazendo para da literatura, diria que estamos no território das reticências... Estaríamos, segundo a autora, na arte contemporânea, diante de uma impossibilidade de leitura, que nos propõe uma outra forma de experenciar a arte:

“(...)A arte nos ensina porque nos coloca frente a um ensinamento “outro”, de outro “modo de ser”, diante de uma experiência com o que nos ultrapassa, do infinito, em que o ser do objeto se nega a vir à luz, e, ao negar-se, leva-nos ao encontro do seu “ruído”, dos vestígios que o ser da obra marca, essa riqueza inominável do que é ser arte na contemporaneidade.”

Nesse contexto, o arte-educador mudaria também seu papel tradicional e passaria a ser mais um auxiliar de seus alunos na percepção dos “ruídos” da arte contemporânea, de outros caminhos possíveis, de “uma arte que é essencialmente ‘um absolutamente outro’, por apresentar algo muito além do que damos conta de ‘dizer’.” Trata-se de uma mudança radical e nada fácil. Mudar hábitos arraigados pelo tempo e pela tradição nunca é simples. Não sei se estamos suficientemente preparados para abandonar nossos conceitos. Não sei nem se seria o caso de abandoná-los. A arte contemporânea não permite mais que a interpretemos através dos conceitos antigos. A arte contemporânea não explica mais o mundo, mas o problematiza, questiona, nos desafia, nos traz mais dúvidas do que certezas, e está seria a grande aprendizagem da arte contemporânea, a possibilidade de estarmos diante de um “abismo”.


Referências:

Koneski, Anita Prado. A Estranha Fala da Arte Contemporânea e o Ensino da Arte. Disponível em

http://ppgav.ceart.udesc.br/revista/edicoes/1ensino_de_arte/4_palindromo_anita.pdf

Acesso em 02/05/2011


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